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Bonoventura Genelli - "Jupiter on the wings of night" |
Para facilitar a tarefa do escriba - que se propõe ao longo
deste artigo tecer as suas próprias considerações sobre as oportunidades e o
potencial dessa combinação - o ideal seria que o leitor tivesse um conhecimento
relativamente sólido e amplo sobre o simbolismo astrológico, em particular –
como é evidente – sobre Júpiter e sobre Virgem, e sobre todas as suas
interacções energéticas e simbólicas.
Aliás, o ideal nem seria isso: o ideal mesmo seria que o
leitor pensasse, soubesse, ou pensasse saber (o que raras vezes é a mesma
coisa), sobre Virgem e Júpiter, as mesmas coisas que o escriba pensa, sabe, ou
pensa saber.
Assim, a tarefa comunicacional do escriba estaria
facilitada: e poderia elencar, directamente, as suas ideias e crenças sobre o
que significa, implica, propõe e simboliza este trânsito astrológico que nos
envolve a todos durante os próximos doze meses. Sem explicações, referências, introduções, contextualizações,
notas de rodapé, revisões ou anúncios.
Isto é, sem precisar de explicar em que conhecimentos e
raciocínios se baseiam, ou fundamentam, as suas crenças, conclusões, e miopias;
mas todos sabemos que quando contamos uma anedota com referências culturais
específicas, desconhecidas do nosso interlocutor, estamos condenados a ter que
explicar a piada perante o sorriso amarelo, ou de boa-vontade forçada, do
outro, que por não partilhar connosco de um referencial comum, não tem como
achar piada ou compreender a punchline a não ser que o contextualizemos.
Um americano, por exemplo, dificilmente vai perceber por que
é que os portugueses fazem dos alentejanos personagens das suas anedotas (and
no, Portugal is not uma província da Spain), da mesma maneira que um noruguês
provavelmente não perceberá por que é que os brasileiros fazem dos portugueses
os alentejanos (ou as louras) das suas piadas.
Da mesma maneira, e pela mesma ordem de ideias, se eu
trouxer à cidade um esquimó, e lhe mostrar na avenida um carro que passou com o
vermelho dizendo “aquele esperto está a
habilitar-se!” (e assumindo, mesmo assim, que o faço numa língua que ambos compreendemos),
é pouco próvavel que o esquimó, mesmo que compreenda as palavras, compreenda também
o sentido do que estou a querer dizer – pois se nunca viu um semáforo, não
conhece as regras do trânsito nem o simbolismo vinculativo das três cores,... que
sentido fará isso para ele, sem mais explicações?
E isto, para não sublinhar
também os restantes condicionalismos que levam a dificuldade ainda mais longe -
isto é, sem falar no sentido de “habilitar-se”
(conhecerá o esquimó, ainda mais além do significado da palavra, a noção de sorteio,
a ironia, o sentido figurativo da expressão?), e muito menos de “esperto” (saberá o esquimó reconhecer a
ironia, se não estiver habituado a falar a nossa língua com todas as suas
nuances, polissemias, e diferentes usos para as mesmas palavras?).
- e não, não vale argumentar que em contrapartida os
esquimós têm dezenas de palavras diferentes para designar “neve” e nós só temos
uma – além disso não ter nada a ver com o raciocínio que estava a ser
desenvolvido, isso é só um boato, um rumor, folclore. Das três, se tiver que
escolher uma, escolho “boato”: já que foi a partir de Franz Boaz, em 1911 mais
precisamente, que essa ideia estapafúrdia, sedutora e contagiosa (como tantas
outras coisas estapafúrdias, infelizmente) começou a propagar-se como um
incêndio em fardos de palha (ou deveríamos dizer, como fardos de palha na
imaginação dos burros?) e, à força de ser repetida indiscriminada e
insistentemente sem nenhum filtro, averiguação ou espírito crítico, começou a
ser geralmente aceite como verdade – como acontece aliás com muitas das
estapafúrdias ideias humanas, e com as piores, geralmente, o que faz delas eminentemente
perigosas apesar de aparentemente inofensivas –
De modo que não, o esquimó não tem trinta palavras
diferentes para designar “neve”.
Nem trinta palavras, nem o hábito de ver
semáforos.
E para termos a certeza de que o esquimó compreenderia o nosso
comentário sobre o esperto que se estava a habilitar no meio do trânsito (e,
neste ponto, “habilitar a quê?”,
pergunta que só por si já exigiria uma série de compreensões prévias por parte
do esquimó, seria totalmente legítimo e oportuno: e o facto de não termos
resposta concreta para dar ao esquimó apenas nos devolve ao carácter altamente
metafórico e figurativo de toda a frase; se o esquimó conhecesse, ao menos, as
manigâncias da autoridade tributária para controlar os contribuintes através da
ganância, ainda podíamos, explorando as intersecções súbitas de sentido em que
se baseia o humor, dizer “ao Audi”, mas isso só nos complicaria ainda mais a
vida e faria com que tivéssemos ainda mais, muito mais para explicar,... se o
conseguíssemos, sem transformar a explicação da piada numa longa consideração
sobre a natureza humana),
para termos a certeza de que o esquimó compreenderia o nosso
comentário sobre o esperto que se estava a habilitar no meio do trânsito,
dizíamos nós, precisaríamos primeiro de o contextualizar: e só depois disso,
contando ainda assim com a sua inteligência, poderíamos ter a esperança (ou a
expectativa) de que o esquimó compreendesse o comentário “aquele esperto está a habilitar-se”, a propósito do carro que
passou com o sinal vermelho. E por essa altura, evidentemente, já o carro
estaria demasiado longe e o comentário já seria totalmente extemporâneo.
Mesmo – ou principalmente – se fosse um Audi.
Mas isto não é o escriba a fazer do leitor, esquimó. Mesmo
porque esquimó significa “comedor de carne crua” – e independentemente dos
hábitos, gostos, preferências e polissemias semânticas próprias do leitor, o
que o escriba tem para partilhar já vem parcialmente digerido, cozinhado,
temperado, e lá por ser servido de bandeja – não significa que tenha de ser
comido.
De modo que isto tudo é apenas para explicar que o ideal
seria que o leitor tivesse de Júpiter e Virgem os mesmos preconceitos, crenças
e atribuições que tem o escriba – que estivesse num transe idêntico (já que
cada um está no seu próprio transe, e o perigoso não é tanto estar num transe;
é não reconhecer o transe e levá-lo a sério, como se fosse “real”), por assim
dizer: uma miopia idêntica, uma ignorância da mesma natureza, qualidade, e
tamanho.
E por falar em tamanho, “adiantemos” já uma das ideias mais
importantes para compreender o resto do artigo: Júpiter, o maior planeta do
sistema solar e o “deus dos deuses” na mitologia olímpica, está associado com o
crescimento, a expansão, o que é grande, maior, ou se amplia para conter mais e
melhor mundo –ampliação e visão de conjunto, por assim dizer; e Virgem, o signo
de Terra mutável regido por Mercúrio, está associado com as coisas pequenas, os
detalhes, a análise, a discriminação, a separação (eu costumo chamar a Virgem o
signo dos mil milhões de merdinhas com que todos temos que lidar diariamente
para manter o nosso mundo a funcionar com um mínimo de ordem) – então Júpiter
em Virgem seria o planeta do “grande deus” a ingressar no signo do “pequeno
pormenor”, por assim dizer.
E é esse o motivo por detrás da nossa escolha de título, clarificando:
se na última vez que Saturno (planeta – e “deus” – da limitação, da
dificuldade, do peso, da negação e do esforço concentrado) passou em Virgem (Setembro
2007 a Julho 2010) este vosso escriba se fartou de recordar, a quem o quisesse
ouvir (ou ler), que “o diabo (Saturno) mora
nos detalhes (Virgem)” (Saturno é, de certa forma, também Satã), então
Júpiter em Virgem - sendo Júpiter o deus supremo do Olimpo (e toda a psique
humana é um Olimpo particular, o que faz com que toda a Vida tenha, ela
própria, o seu próprio Olimpo nascido dos Olimpos) – é “o deus das pequenas
coisas”.
Que é como quem diz, o perto se faz longe; uma viagem de mil
quilómetros começa com um passo; ou muitas pequeninas mudanças resultam numa
grande mudança – ou será que o bater das asas da borboleta em Tóquio já não
provoca tufões em Nova Iorque?
Não é preciso invocar a Teoria do Caos para expandir as
ideias deste artigo.
Mesmo porque se Júpiter adora teorias, a verdade é que Virgem
abomina o caos.
Talvez seja por isso que Virgem representa uma oportunidade
(ou deveríamos dizer, uma necessidade?) de pôr a Vida em ordem –
- e Júpiter aí, as bençãos a que nos abrimos quando nos
abrimos a fazê-lo.
Júpiter e Virgem:
explicando a piada ao esquimó
Não é assim tão inocente, acidental, ou disparatada a imagem
de ter de explicar uma piada a um esquimó – Júpiter representa o que é
distante, longínquo, diferente; outras culturas, outras visões do mundo, religiões,
filosofias, fés e crenças, a ampliação das visões particulares que as vai
tornando cada vez mais universais, ou conduzindo na descoberta de um substrato
comum. É a eterna expansão e busca de um conhecimento cada vez mais abrangente,
por isso necessariamente mais abstracto e essencial, como uma filosofia perene,
uma sabedoria arcana, a unidade transcendente – parafraseando o Frithjof Schuon
– por detrás das religiões.
Em sânscrito, Júpiter é “guru” – aquele que aponta, mostra
ou revela o caminho. A seta de Sagitário, signo regido por Júpiter, aponta a
direcção inequívoca, orientada, vamos dizer – crédula, optimista, ou confiante (“ter”
ou “fazer” fé, como dizem os franceses, é confiar, acreditar, fazer a aposta,
avançar na direcção tida como certa, melhor, ideal, ou segura – apostar no que
não nos desaponte: e não deixa de ser curioso, e evidente, que para nos
desapontarmos, temos que ter feito pontaria antes, e todos apontamos para algum
lado, todos acreditamos nalguma coisa, todos vivemos condicionados (ou
ampliados) pela natureza das nossas crenças – não sabemos é da qualidade nem da
relevância do alvo que nomeamos, i.e., em que “acreditamos”; mas essa é
precisamente a pró_cura jupiteriana, parte fundamental da sua busca e não há
como haver, portanto, nenhuma resposta prévia à experiência – o que pode, sim, haver é uma sequência
de respostas nascidas da experiência - e cada vez, se deus quiser, mais
“afinadas” ou bem “apontadas” a alvos mais "fiáveis").
Júpiter simboliza, portanto, a busca, por parte do Homem, de
um sentido, de um significado “maior” para a sua existência. Leis humanas
baseiam-se na crença do que é bom, correcto e justo; leis universais, na compreensão
natureza do cosmos manifestado, nos princípios inteligentes que o organizam,
estruturam, e explicam. Leis físicas, no estudo e compreensão das limitações e
regras do mundo material. Leis espirituais, na natureza do espírito humano.
Leis civis, no que é considerado como “verdadeiro”, “bom” e “correcto” para um
conjunto de seres humanos. Leis marciais, no poder decisório de uma autoridade
militar.
Os seres humanos, que são sumamente espertos a querer passar
pelas malhas da rede, a ignorar princípios universais e a agarrarem-se a
exemplos e casos concretos, a ignorarem a ética para se defenderem com a “letra
da lei” (pense, por um instante, na diferença entre “legal” e “ético”, e terá
um vislumbre da dimensão de propósito, sentido, ou valor mais elevado a que
Júpiter se refere, e que está – tantas vezes – tão mais além do que pelos
homens é considerado “legal”),
estes humanos espertos que também gostam de fintar semáforos
quando aparentemente não há consequências à vista nem polícia a ver (como não
há polícia à vista, acham que não há mais lei nenhuma, autoridade nenhuma, nem
consequência nenhuma para as suas próprias acções, isto é, que quebram as leis
e saem impunes: talvez seja assim com as leis dos homens, mas não com as leis
maiores a que Júpiter se refere – pelo menos é nisso que o “meu” Júpiter
acredita, e cada um é absolutamente livre – e responsável – de viver de acordo
com aquilo em que acredita,
estes humanos espertos tiveram de criar trinta e cinco mil
milhões de leis para se obrigarem a cumprir dez simples mandamentos. Júpiter
fala de sabedoria, de princípios éticos, baseados numa visão do mundo, do Homem
e do seu lugar no universo. Júpiter fala dos princípios por detrás dos
mandamentos, ou – para o caso – do “espírito” que presidiu à elaboração de uma
Constituição, i.e., a “visão particular” por detrás da “Lei Fundamental” de um
país, cultura, ou sociedade.
O que Júpiter intui como princípio abstracto, ou Lei,
Mercúrio traduz em ideias, conceitos e palavras, justifica-as, racionaliza-as,
argumenta, organiza logicamente e
encadeia os raciocínios, enfim, organiza-as, explicita-as, e torna-as
comunicáveis, i.e., passíveis de serem compreendidas e postas em comum.
Um pouco como este escriba, que teve uma visão, uma imagem,
uma ideia, um apelo, uma intuição integradora - e agora está sentado há várias
horas a encaixar um milhão de peças para compôr uma unidade minimamente
organizada, sequencial, lógica, interpretável e compreensível, para tentar
fazer deste milhão de peças bem encaixadas a representação o menos imperfeita
possível da ideia, ou da imagem original, no seu sentido, significado,
implicações, associações, e poder primordial – que vem muito mais da sua
essência e qualidade originais do que da forma como é reconstituída, montada,
apresentada
- seria isso que os budistas zen queriam dizer com “um dedo aponta a Lua; uma vez reconhecida a
Lua, apenas um tolo fica a olhar para o dedo”? –
As palavras são o dedo. Aquilo para que as palavras apontam
são a Lua. Precisamos do dedo para apontar a Lua, i.e., das palavras para as
ideias – mas estamos mal, quando ficamos fascinados com as palavras, os dedos,
e nos focamos na forma, mais do que na essência. Na “letra”, mais do que no
“espírito”. No Mercúrio, mais do que no Júpiter.
Por isso, quando a energia (ou o tempo, que é um dos limites
às possibilidades da energia) é perdida quase toda ela com as palavras e as
explicações, perde-se o essencial. Como na piada do carro no semáforo vermelho.
Quando nos perdemos no não-essencial, o essencial perde-se de vista. É por isso
que ter um referencial, um horizonte comum, não só facilita, como viabiliza a
comunicação.
Mas não deixa de ser verdade que é pela comunicação que
renegociamos e temos a oportunidade de ampliar os nossos horizontes e
referenciais.
É por isso que Mercúrio e Júpiter, ou os signos Gémeos e
Sagitário, regidos por estes planetas, são chamados o “eixo” (um par de signos
opostos e complementares é um “eixo”) do ensino e da aprendizagem.
A comunicação (Gémeos) de princípios abstractos (Sagitário).
O sentido (Sagitário) da informação (Gémeos). A comunicação e o movimento
(Gémeos) como via para ampliar a compreensão (Sagitário). A visão de conjunto
(Sagitário) que permite ordenar, contextualizar e atribuir sentido (Sagitário)
à imensidão de conhecimentos e informações (Gémeos) que a cada momento temos ao
nosso dispor. As palavras (Gémeos) que traduzem, ainda que imperfeitamente, os
princípios (Sagitário). As ideias (Gémeos) que traduzem e permitem
aproximar-nos dos ideais (Sagitário) – tornando assim o distante (Sagitário),
mais próximo (Gémeos) ou, pela mesma via, levando-nos a descobrir (Gémeos)
“paragens” cada vez mais longíquas (Sagitário).
Essa é uma das razões para ter associado a Gémeos, nos
textos deste blogue, o Dom da Curiosidade – e a Sagitário, o Dom do Sentido.
E curiosamente – ou talvez não -, Mercúrio e Júpiter regem
ainda dois outros signos. Como já foi dito, Mercúrio rege Virgem; e Júpiter é
co-regente de Peixes. Em Gémeos, Mercúrio rege um signo de Ar: abstracção,
comunicação, ideia, palavra, conceito, informação, movimento. Em Virgem,
Mercúrio rege um signo de Terra: informação aplicada ao mundo concreto. Mente
racional orientada para o real. Análise, discriminação, correcção,
aperfeiçoamento, melhoria. Em Gémeos, Mercúrio explica-nos o que é um relógio.
Em Virgem, descobre como funcionam os seus mecanismos.
E Júpiter, em Peixes, representa a busca da Unidade
fundamental por detrás de tudo quanto existe. Afinal, Peixes é um signo de Água
e o mais característico da Água é a sua universalidade, natureza fusional, e
não-resistência.
Quando arrefecida, a água congela. Quando aquecida,
descongela, ferve e evapora. Quando o vapor arrefece, condensa e volta ao
estado líquido. Num recipiente redondo, a água assume a forma redonda; num
quadrado, a água também se adapta. Sempre assume a forma do seu contentor,
sempre muda de estado, sempre vai ao encontro e deixa-se adaptar, sem resistir
– mas nisso consiste precisamente a sua força irresistível: nunca confrontando
o que é diferente, numa espécie de acção pela não-acção a que os orientais
chamam wu-wei, a Água nunca perde a
sua natureza essencial, por muitas adaptações a que seja sujeita, e nunca, mas
nunca deixa de se cumprir a inevitabilidade do seu encontro consigo própria,
i.e., com o mar - o oceano - o sem princípio nem fim.
Então em Gémeos/Sagitário temos Mercúrio e Júpiter a reger o
Ar e o Fogo: estes são Elementos complementares e compatíveis. Ambos são yang,
i.e., orientados para fora, para o movimento, para a mudança, a diferença, a
separação, e para cima, para a frente, para o futuro. Não estão sujeitos ao
princípio da Gravidade (gravitas), que “puxa” para “baixo”, e para “trás”, mas
funcionam de acordo com o princípio de “levitas”, isto é, aquilo que se ergue,
eleva, “avança”, progride. Fogo e Ar têm em comum várias coisas, às quais
acrescentamos apenas, para o que nos interessa aqui e agora: a abstracção, a
leveza, e as possibilidades no futuro.
Na tipologia das funções psíquicas de Jung, o Ar estaria
associado ao Pensamento, e o Fogo à Intuição. O Ar trabalha com ideias e
pensamentos e palavras e com a capacidade de abstracção que lhes está por
detrás; e o Fogo intui possibilidades, i.e., refere-se mais ao que “pode (vir
a) ser”, mas que não existe (ainda) no aqui e agora: o Fogo é o elemento que
mais se projecta no futuro, quero dizer, no mundo das possibilidades que ainda
não existem. Pioneiro, visionário, idealista, entusiasta: essa é a psicologia
do Fogo (não confundir com “A Psicanálise do Fogo”, que tem muito a ver, mas
não é disso que falamos: é mesmo da “psicologia” do Fogo, se o Fogo tiver(sse)
“psique”).
Mas em Virgem/Peixes, o segundo eixo regido por Mercúrio e por
Júpiter, assistimos à regência destes planetas sobre a Terra e a Água - que são
entre si compatíveis, mas nenhum deles com o Fogo, nem com o Ar. Terra e Água
são elementos yin, i.e., orientados para “dentro” e para “baixo”, para trás,
para o presente (Terra) e o passado (Água) – “onde” se está (Terra) e “de onde”
se vem (Água, o elemento da memória).
Terra e Água são elementos mais ligados com a “realidade”:
Terra é a “realidade” objectiva, exterior, o concreto. Dinheiro, casa,
trabalho, roupa, quadro, comida, corpo, exercício, calendário, relógio,
enfim... coisas... coisas que limitam (e são delimitadas) pelo “real”, pelo
menos na percepção humana, e na visão mecanicista, ou newtoniana, de que os
objectos existem separados entre si por um espaço vazio, agem uns sobre os
outros, e são compostos de “blocos constituintes” chamados de átomos.
E Água é também “realidade” (por oposição a “possibilidade”
– talvez pudessemos chamar-lhe “actual” por oposição a “potencial”), mas uma
realidade “subjectiva”, i.e., referente ao próprio sujeito: o seu sentir, o seu
recordar, as suas oscilações, as suas “realidades” psico-dinâmicas. Que não têm
necessariamente correspondência nem com o que a Terra percepciona como real, o
Ar pensa desapegadamente, ou o Fogo intui com entusiasmo.
Na tipologia jungiana, a Terra corresponderia à função
Sensação e a Água à função Sentimento: se a Água sente, a Terra percepciona; e
se o Ar pensa, o Fogo expande. E da integração relativa dessas quatro funções
em nós, se compõe o modo como apreendemos – e avaliamos – o que para nós existe
e é “real”. Existe o que vejo? O que vejo é o que existe? Existe o que sinto? O
que sinto é o que existe? Existe o que penso? O que penso é o que existe? Existe
o que acredito que pode existir? O que acredito que existe é o que existe? O
que é que existe? O que é que pode existir? O que é real? O que é possível? O
que é evidente? O que é ideal? O que é o que é, e o que é que é?
Mas isto era só um parêntesis, para acabar de explicar a
anedota ao esquimó. Afinal, é através da Terra prática de Virgem que vamos precisar compreender as abstracções a que Júpiter se refere, e é decompondo em partes analisáveis que podemos ter a esperança de vir a reconhecer, através das partes, algo maior do que a sua simples soma: é o holismo do eixo Virgem-Peixes.
E não vai ser necessário, para poder contar finalmente a piada ao esquimó, falar da autoridade tributária nem
da factura da sorte (embora Júpiter tenha muito que ver com a sorte, a factura
não é para aqui chamada – “factura” é mais do departamento de Saturno, e um bom
título para um artigo sobre Saturno poderia ser, precisamente, “a factura da
sorte”. Mas isso é para outro momento).
Falta apenas explicar algumas coisas sobre as relações entre
Mercúrio, Júpiter, e Virgem – para podermos, finalmente, apresentar as nossas
teses sobre o que Júpiter em Virgem vai significar para todos, e cada um de nós
durante os próximos meses.
* fim da primeira parte *
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